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quarta-feira, 27 de junho de 2012

Crepúsculo





" O tempo tudo consome
Passando breve e ligeiro
Que quer que o tempo retorna
Será sempre prazenteiro.

Quer o pobre tenha fome
Ou o rico muito dinheiro
O tempo passa incolume
Indiferente e sobranceiro.

Eu queria o tempo parar
Nem que fosse por um momento
Para poder apreciar

A vida que já vivi
E que deixei o tempo
Pelos caminhos seguir ..."

Antonio dos Santos



Passei a tarde de hoje conversando com minha avó de 87 anos.
Já falei sobre ela num post a alguns meses atrás.
Mulher batalhadora e forte, que aos 33 anos ficou viúva com 06 filhos para cuidar.
Assumiu sozinha a criação desses filhos (nunca mais se casou), tornou-se vendedora de produtos da Avon e conseguiu “formar” todos os filhos.
Falante, adora conversar, mas hoje, especialmente recordar.
Por ser eu a neta mais velha,  ouço desde pequena suas histórias do passado. Da Cuiabá antiga,  de sua infância no Bau, da ingenuidade daqueles tempos, de tomar banho no rio e estudar tabuada em  árvores .
Conta-me sobre o seu casamento com o comerciante português que a levou para morar distante dos seus familiares, das cidades que viveu com seus filhos e marido e das tragédias que suplantou com firmeza e coragem.
Nunca  ouvi em nenhum dos seus relatos reclamação ou questionamento, pelo contrário, sempre  passou uma  imagem de uma vida feliz e plena com sua família.

Parece um mundo "cor-de-rosa", mas acredito que essa foi a sua fórmula mágica para sobreviver e lutar. 
De uns anos para cá, começaram seus problemas de memória,  troca do nome dos netos, lapsos, "brancos", esquecimento de objetos e a confusão mental  passou a se tornar algo rotineiro.

Pensavámos -  faz parte do envelhecer  e assim fomos nos adaptando a essa nova “fase” da vida dela.

Mas hoje, após ela contar pela  13º vez num intervalo de 2 horas do novo  programa de TV que ela havia assistido pela manhã, senti um amor imenso por ela e uma vontade de abraça-la e aconchega-la no meu colo, agradecendo por tudo que ela fez por nós enquanto mãe, avó e mulher.

Olhei-a profundamente e compreendi que a vida passa rápido e que estamos presos ao nosso  corpo e destino.

E que temos que aproveitar de maneira intensa e positiva cada momento vivido, pois não temos nenhum controle sobre o nosso amanhã.



Entendi sua sabedoria de viver a vida com aquilo que a vida lhe oferece, "surfando" quando necessário, resignando-se com os caldos, mas sempre em cima da prancha, guiando-nos.


 
Transcrevo uma parte do texto colhido do livro "Ostra Feliz não faz pérola", sobre a Velhice.


"A metáfora mais bonita que conheço para a velhice é o crepúsculo, o por do sol. O crepusculo é lindo. Faz pensar. No crepúsculo tomamos consciência da rapidez do tempo. As cores rapidamente passam do azul, para o verde, para o amarelo, para o abóbora, para o vermelho, para o roxo, para o negro. No crepúsculo senti o tempo fluir rapidamente... O crepúsculo diferente da manhã tem outro tipo de beleza, a beleza tranquila, silenciosa, talvez solitária."

Obrigada vovó por me ensinar mais esta lição  !!!

 ..... Mas o relógio não desiste. Continuará a nos chamar à sabedoria: "tempus fugit…" "carpe diem"
Quem sabe que o tempo está fugindo descobre, subitamente, a beleza única do momento que nunca mais será…"






quinta-feira, 14 de junho de 2012

O leme e a vela ...




“ Vossa razão e a vossa paixão são o leme e as velas de vossa alma navegante. Se vossas velas e vosso leme se quebram, só podereis derivar ou permanecer imóveis no meio do mar. Pois a razão reinando sozinha, restringe o impulso e a paixão deixada por si só é um fogo que arde até a própria destruição.
......
 Deixe tua alma exaltar a tua razão às alturas da paixão,para que ela possa cantar; e que tua paixão seja dirigida pela razão, que tua paixão possa viver pela própria ressurreição diária, como a fênix, elevar-se acima das próprias cinzas.”
Khalil Gibran



Dizem que o ócio é criativo e nessa atual fase de reclusão, onde estou a cuidar da minha saúde física, descobri que estou a lapidar meu espírito igualmente.


O dia é longo e quando estou bem disposta, consigo ler,  ouvir música, assistir filmes, relaxar e simplesmente descansar, isso quando as crianças não estão por perto, com aquele burburinho delicioso de algazarra infantil.



O silêncio então me faz companhia.


Estar em silêncio é um exercício mental ainda “penoso/trabalhoso” pra mim, principalmente porque não estou acostumada a meditar.


Somos incentivados a fazer inúmeras atividades ao mesmo tempo e ficamos viciados na adrenalina, o cérebro não consegue "parar".



Hoje, eu olho para o dia a dia dos meus filhos e vejo que faço isso com eles, é aula de inglês, futebol, pintura, natação, kumon e assim vai... E o engraçado é que eu também caio nessa maratona de atividades.


E com o passar do tempo, estar em movimento vira vício e nem percebemos o quanto isso pode nos afetar, pois caímos muitas vezes no olho do furacão da vida e somos jogados de um lado para outro sem perceber o que nos acontece.


Estou me sentindo assim ... Como se tivesse saído do olho do furacão e agora, com os pés no chão novamente tenho vários caminhos a seguir que podem até se cruzar lá na frente.


Assim tenho andado um pouco introspectiva.


Acho que faz parte de todo esse processo de aprendizagem  ... 


Alguns acham que estar em silêncio ou estado contemplativo seja sinônimo de tristeza ou chateação.


Penso o contrário, o silêncio da reflexão exprime a busca pelo autoconhecimento, num exame interior de busca da consciência por si mesma.


Ouvir o que se passa na “cuca” sem alarde ou intromissão e necessariamente sem pressa em concluir.


Assim, outro dia ouvindo uma música cantada por Cazuza. me liguei a um verso específico que dizia: Você sonhava acordada / um jeito de não sentir dor / prendia o choro e aguava o bom do amor...”


E passei a refletir sobre essa frase: Prender o choro e aguar o bom do amor.


Eu entendo que sonhar acordada, um jeito de não sentir dor é fingir que  tudo esta bem,  prender o choro é enclausurar um sentimento, levando   a aguar o bom da amor, ou seja, tirar o sabor ou o que é bom do amor.


Comecei a refletir e percebi o quanto nós aguamos nossos desejos e sonhos.


Desde de deixar de comprar a roupa “perfeita” mas caríssima por uma mais ou menos, deixar de ir a um show que tem vontade e até quando aceitamos funções não almejadas.


Pesamos e sopesamos e colocamos esses desejos no depósito de “coisas ainda a fazer nessa existência.”


Ás vezes o depósito está tão cheio que é necessario arejar o ambiente. Dessa forma, entramos no depósito e escolhermos alguns sonhos/desejos para realizar ou descartar por completo.


A verdadeira arte está em saber escolher qual realiza-lo. E quanto aos que deverão ser descartados, faze-los de maneira consciente para não regurgitarmos depois.


Essa intensa competição interna nos move ao longo da vida – viver sob a égide da paixão ou da razão.


A quem devemos obedecer? É possível fazer uso dessas duas forças motrizes numa só decisão? O tempo nos torna mais sábio para saber discernir e escolher?


Aprender a fazer a razão e paixão andar aliadas é o ponto nevrálgico do problema é o “x” da questão.


E o poema de Khalil Gibran define de maneira doce e singela: um (razão) deve andar com o outro (paixão) e quando isso não acontece, corremos o risco de ficarmos parados (razão) ou de nos incendiarmos (paixão).


O que nos leva a colocar a razão para nos dirigir e “aguar” os momentos  em que queremos algo a todo custo?


De outra ponta, vale a pena colocar a paixão acima da razão e deixarmos que decisões precipitadas e hedonistas movimentem nossa vida?


A questão não é matemática, antes fosse, pois bastaria somar 2 + 2 e teríamos quatro, mas as variáveis são muitas, e a equação está mais para (2x + y) x z= 157.


Encontrar o x correto, o y ideal e o z perfeito é a missão.


E matemática nunca foi o meu forte


Li num livro que devemos canalizar a razão, usando-a para dirigir o veículo e fazer da paixão o alimento do motor desse veículo.

Nessa intrincada rede de pensamentos e desejos, estou a decidir por um período sabático.


Sim, após o tratamento que já está em sua fase final.


Aprendi o termo SABÁTICO a poucos anos.


Na web pesquisei sobre isso e descobri que a palavra sabático vem do hebraico shabbat, que significa repouso, parada, descanso.


No  Antigo Testamento era o período determinado a cada 07 anos, em que a terra ficava sem cultivo para depois iniciar um novo ciclo de fecundidade.  


Nos dias atuais “tirar período sabático” significa dar um tempo para reavaliação da vida pessoal e profissional, olhar retrospectivamente para fragilidades e potencialidades que ainda não foram mapeadas.


É sair do emprego para ter um tempo para se aprofundar em estudos de interesse pessoal; viagens, cursos não relacionados a carreira.


Pode não ser bom para a carreira, mas acredito que ajuda a carregar as energias.

No serviço público temos as licenças prêmios, que é um direito do servidor a cada 05 anos de trabalho, o gozo de 03 meses de licença.

Desconheço o espírito da lei que criou a licença prêmio, mas ela pode servir para ser o sabático dos servidores públicos !! rsrsrsrsrs E como só no Brasil acontece certas coisas, existiu uma época que o Estado “comprava” as licenças prêmios e poucos servidores realmente faziam uso dela.

No mundo artístico temos o exemplo da jornalista Glória Maria fez uso do período sabático quando saiu do Fantástico - descansou e acabou adotando duas meninas. Outro exemplo foi Tony Ramos que elegeu 2011 como ano sabático e até Tom Cavalcante afirmou em entrevista que está em período sabático.

Sinto que preciso desse tempo, pois tal como uma lagarta que esta prestes a sair do casulo, preciso encontrar meu novo caminho...


quarta-feira, 6 de junho de 2012

Compartilhar ...




A decisão de compartilhar sentimentos e fatos via web foi um dos grandes “achados” no tratamento que faço e tem me ajudado a superar tropeços e fases.



 
Compartilhar, conforme Sócrates é  “O grande segredo para plenitude” e  tem ocupado papel fundamental nesse embate que travo com o tumor gástrico.



 
Ao externar os anseios e as expectativas que pululam meu consciente racional e emotivo, eu consigo “identificar” o que está "desconectado" e entender minhas emoções.



Meu sobrinho Bruno Emanuel de 04 anos identifica e compartilha  sem grandes elucubrações seus desejos e sentimentos desde os três anos de idade, quando o ouvi pela primeira vez externizar o que lhe vinha do coração: "Estou com raiva". 



 
Na sua inocência e pureza, não procura achar "culpados", simplesmente identifica o que lhe passa na alma. 


 
Infelizmente essa inocência vai se perdendo ao longo do crescimento e nós começamos a colocar "verniz" de boa aparência ou controle sobre as emoções que nos cercam e de repente, não sabemos mais qual é a "cor original."


 
É Bruninho, você tem ensinado a madrinha !!!!


Compartilhar é dividir o que temos com as pessoas a nosso redor, bem como com aqueles que jamais teremos a chance de conhecer.


E estou curtindo esse momento de maneira singular, sendo muito gratificante reconhecer meus sentimentos e pensamentos nessas histórias e linhas escritas sem pretensão literária (longe disso).
 

O que busco além de repartir minhas vivências é fomentar bons sentimentos e até “ajudar” a quem esteja passando por momentos turbulentos.
 

Nos Estados Unidos existem grupos de apoio a pacientes com diagnóstico de câncer que os ajudam através da troca de experiências, relatos, apoio psicológico a superar medos, desafios e  obstáculos causados pela doença.


No Brasil é muito raro encontrar esses grupos de apoio e eu até já pesquisei, mas achei apenas em alguns hospitais localizados nas grandes cidades.


Em Cuiabá, estou conhecendo o trabalho realizado pela ONG  MTmamma e é muito interessante observar a importância desse trabalho de solidariedade e coletividade para ideal comum, contudo atende como próprio nome diz pacientes com câncer de mama.


Nas clínicas de oncologia (particulares) existem trabalho multidisciplinares, com nutricionista, psicóloga, porém desconheço  trabalho realizado com Grupo de Apoio – envolvendo pessoas que tem e tiveram cancer.


Eu acredito que falar sobre o câncer ajuda a conhece-lo e conhecendo-o podemos desmistificá-lo, tira-lhe o caráter misterioso ...   


Assim, comecei a escrever, utilizando o blog como um Grupo de Apoio.
 

É certo que expor fatos de minha vida (parte dela) não é tarefa fácil e por vezes termino o post cansada, mas é gratificante reler as histórias escritas e ouvir comentários positivos de amigos incentivando-me a continuar escrever.


Um texto exige dedicação para construção mental.


 
Os pensamentos partem de coisas simples, de situações lidas, vividas e ouvidas do cotidiano que somados a algumas tramas internas compartilho com vocês.

Enfim é como um fio de tear, em que eu começo a puxar, mas não sei com precisão inicial aonde quero chegar. Ás vezes são idéias fulminantes outras duram dias para se fechar. 


Os temas vão surgindo e aprendi a deixa-los fluir como uma tempestade de ideias.


 
Não os censuro, escrevo num caderninho os pontos que deixaram de ser trabalhados naquele texto para que posteriormente possa me dedicar aquilo retirado.


Quando compartilho pensamentos e emoções sei de minha exposição ao mundo e a opinião dele. 


E até certo ponto acho isso instigante.

Podemos compartilhar boas atitudes, experiências engraçadas, vivências tristes, enfim podemos expor nossa vida, como um amontoado de retalhos, tecido pelas experiências e tramas da vida que se entrelaçam e cruzam muitas vezes.

Enquanto estava em São Paulo aguardando a cirurgia, dentre alguns livros apresentados por minha Tia Bety, um logo me chamou a atenção - “Ostra feliz não faz pérola” de Rubem Alves.

Nele o escritor recheia fatos vividos e pensamentos tidos ao longo de sua vida, que ele escrevia em uma “cadernetinha”.

Não eram tratados nem teses filosóficas, mas "coisas" brotadas do cotidiano. O livro não tem início, meio e fim, são histórias que valem por si só.


Fala sobre Amor, Beleza, Crianças, Educação, Natureza, Política, Velhice e outros temas. De maneira simples, direta e até divertida os aborda sem tirar a seriedade dos assuntos.


Ele diz que a ostra para fazer uma pérola, precisa ter dentro de si um grão de areia que a faça sofrer. Sofrendo, a ostra diz para si mesma: “Preciso envolver essa areia pontuda que me machuca com uma esfera lisa que lhe tire as pontas ...


A beleza (pérola) não elimina a tragédia, mas a torna suportável.



Vale a leitura ...