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terça-feira, 21 de agosto de 2012

Navegando ...




"Depois do diagnóstico da recidiva e do tratamento de quimioterapia e posterior cirurgia, me sinto navegar por águas calmas, embora escuras e profundas.


Nessa viagem alucinante e não voluntária (pelo menos não conscientemente) ainda evito me aproximar da borda da embarcação e até de me mover no barco, que o descrevo  como uma “canoa” frágil, porém de base sólida.


A calmaria das águas contraditoriamente me assusta e alivia ao mesmo tempo.

A canoa continua a descer o rio, em velocidade própria, tendo se negado a desistir ou a se entregar às ondulações do rio e às  nuvens que no céu prometiam furacões.



É certo que essa canoa está meio mulambenta, com cicatrizes e marcas permanentes, tanto no casco quanto no seu interior.


Contudo essas marcas não a tornam mais feia, servem de sadia lembrança acerca de quão efêmera é a vida.


O brilho do sol refletido nessas marcas as fazem brilhar, tal qual medalhas das batalhas já vividas.


Há dias em que aprecio a brisa, o luar, o sol, o cheiro de peixe, a escuridão da água.



E outros que um leve tremor no remo me faz parar de respirar ...   

Os dias passam lentamente...


Olho com euforia a paisagem que desliza lateralmente.


Por que não as enxerguei antes? Estavam elas escondidas ?


Aprecio e ouço o querem dizer.


Às vezes, teimosamente tento remar depressa como fazia anteriormente, mas a sábia canoa placidamente me demonstra que iremos “emborcar” se mantivermos esse ritmo.

Rio com ela e agradeço a lembrança da minha limitação.  


Olho por entre os bancos da canoa e não vejo mais tantos objetos e estorvos que me serviam como âncora.

Durante a viagem foram cuidadosamente jogados fora e de tão descartáveis e superfulos não fazem falta.


Adquiri novos objetos, mas desta feita, atentei-me com maior atenção as datas de validade, ao peso e a fabricação do produto incorporado a embarcação.

Não posso errar novamente e nem quero atrasar mais a minha missão."



 










  

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