Translate

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

A grama do vizinho é mais verde que a nossa ??

 

 

“Ninguém permanece satisfeito com o que tem, olhando para o que é dos outros, é por isso que nos iramos até contra os deuses, quando alguém nos ultrapassa, esquecidos dos homens que ficam para trás. (...) Queres saber qual é o teu maior vício? Fazes mal as contas: valorizas demasiado o que te oferecem, mas desvalorizas o que tens.”

                                              Seneca in “ Da Ira”

 

 

 

Nesse feriado prolongado fiquei em casa, ora servindo de motorista para duas crianças ora assistindo filmes.

  

Coincidentemente assisti a quatro diferentes estórias, mas com  o mesmo enfoque – a eterna insatisfação humana.

 

Nos filmes que assisti a felicidade estava defronte aos personagens, mas eles sempre a buscavam em outros lugares e outras pessoas.

 

A primeira estória foi no filme “Um Dia” que narra os encontros e desencontros amorosos de dois amigos (uma mulher e um homem) ao longo de uma amizade de 20 anos. Onde numa busca incessante e insatisfeita pela vida, não conseguiam enxergar a existência de um amor maior e verdadeiro entre ambos.

 
 

Já no filme nacional  “Estamos Juntos”, a estória se passa diante do medo de uma jovem médica residente de se entregar a qualquer tipo de envolvimento: seja amizade ou amor. Vive de amores rápidos e amizades superficiais. Passando o filme questionando se o medo de amar torna as pessoas mais egoístas.

 

 

A terceira estória se passou no quadro em reprise do fantástico “A vida como ela é” de Nelson Rodrigues, onde um casal vive um relacionamento conjugal “morno” após 07 anos de casamento e só com a chegada de um casal de vizinhos, que “em tese” possuíam um relacionamento sexual intenso, gerando a inveja e cobiça desse primeiro casal é que os motiva a se redescobrirem e investirem no antigo relacionamento conjugal novamente.

  

E por último e para fechar o final de semana, assisti a comédia argentina “Um namorado para minha esposa” que passou no Corujão da Globo. Que conta a estória de um relacionamento desgastado de um jovem casal, visto a mulher possuir mal humor terrível que acovarda o marido a pedir o divórcio, mas para sanar o problema,  ele  resolve seguir o conselho de um amigo e contrata um outro homem para que a esposa se apaixone e o liberte do infeliz casamento. O hilário é que no decorrer do filme, o marido descobre que ainda amava a mulher e se desespera ao perceber que irá perde-la para outro, que não é o “namorado” escolhido por ele.

 

O ponto convergente nessas quatro “estórias” é a eterna insatisfação do ser humano.

 
Por que estamos sempre procurando padrões e perfeições que não existem em nós e/ou nos outros.

 

 Veja se não é verdade, quando compramos um carro novo, estamos felizes e até orgulhosos com essa aquisição, mas basta parar no primeiro sinaleiro e encostar ao nosso lado outro carro “em tese” mais equipado, para começarmos a olhar o nosso com um “que” de decepcionado.

 
 

Conheço uma pessoa  e digo sempre a ela com amor: “Pare com isso, você esta sendo masoquista”, senão vejamos: ela compra uma roupa e fica a pesquisar  em outras lojas após a compra para ver se fez um bom negócio. Não se satisfaz até achar um lugar aonde encontra uma calça mais barata e bonita. Daí sim fica satisfeita.
 
 
E assim agimos de maneira parecida nos relacionamentos que mantemos, nos empregos que conseguimos, nos carros/casas/Ipads/celulares  e outros objetos transitórios que adquirimos.
 
 
Parece que quando alcançamos algo, isso já serve de trampolim para outros desejos...
 
 
O ponto positivo dessa eterna insatisfação humana é que ela faz o mundo girar, movimentar, pois provoca mudanças ao redor.
 
 
A satisfação ao contrário acalma, limita e amortece.
 
 
O problema é quando essa insatisfação se transforma em círculo vicioso de ansiedade, onde adquirimos e/ou conquistamos algo e logo após estamos olhando a “grama verde do vizinho”.
 
 
 
 

 

A necessidade de “conquistar”, do poder, do dominar nos faz abdicar daquela necessidade de apreciar e manter o que de fato não é transitório em nossas vidas, que são as pessoas que temos ao nosso redor, sejam elas amigas ou amores.

     

Dêem uma olhada no ponto de ônibus, no shopping center, no trabalho, na sua rede de convívio.

 

Ouvimos e vimos poucos relatos de pessoas satisfeitos.

 

Se faz calor reclamamos que é ruim, mas se faz frio é pior.

 

Se estar desempregado é ruim,  ter que trabalhar semanalmente também não é bom. (É só ler as mensagens do Facebook, quando se aproxima sexta feira ou segunda feira ... é cômico.)

 

Se estar casado é enfadonho, estar solteiro é cansativo (tanto que estão sempre em busca de alguém ...)  

 

O tempo passa e isso se torna crônico na vida das pessoas.

 

Reclamar, reclamar, reclamar ...

 

Insatisfação, insatisfação ...

 

O poema de Millor Fernandes ilustra esse sentimento contínuo.

 

“ O que me dói

É que quando está tudo acabado

Pronto pronto

Não há nada acabado

Nem pronto pronto

Pintou-me a casa toda

Esta tudo limpo

O armário fechado

A roupa arrumada

Tudo belo, perfeito

E no mesmo instante

Em que aperfeiçoamos a perfeição

Uma lasca diminuta, tênue, microscópica

Não sei de onde

Está começando

Na pintura da casa

E as traças não sei onde

Estão batendo asas

E a poeira, em geral, está caindo invisível,

E a ferrugem está comendo não sei o que

E não há jeito de parar ...”

 

 

Tive uma experiência curiosa quando num domingo qualquer (nessa terra quente chamada Cuiabá) passeava no shopping (usufruindo do ar condicionado) e encontrei com 03 amigos-conhecidos.

 

Desses três encontros casuais, dois reclamaram do calor, emprego e governo e apenas um relatou a alegria que estava com o crescimento do filho.    

 

A sensação de leveza e bem estar oriunda da conversa com o amigo-satisfeito, me fez refletir em dialética (comparando)   acerca no peso e mal estar advinda da conversa com os outros dois.

 

Almejar eterna satisfação é viver insatisfeito, pois ela não existe de forma perpetua.
 
O que não nos impossibilita de cultiva-la nos breves e singelos momentos da vida -  que nos acalma e amortece das "cobranças e anseios diários".

 

Procurar a satisfação/felicidade  sem sofreguidão e nem requisitos/padrões estabelecidos nos pequenos momentos que vivenciamos no dia a dia é que  tornam as nossas lembranças duradouras.

 

Assim retorno ao início deste post, quando comecei escrevendo  que passei o feriado prolongado, ora servindo de motorista para meus filhos ora assistindo filmes.
 
O "tom ou sentido" parecia insatisfeito e tedioso, não é?

 

Todavia, afirmo que tirando o cansaço físico, vivi com meus filhos e marido momentos de bate-papo sério e de brincadeiras gostosas dentro do carro, sendo “Bons momentos” armazenados na memória de minha vivência e que poderão  ser apreciados e lembrados quando Túlio e Tiago estiverem adultos e não precisarem mais desta “motorista” para leva-los e busca-los em suas festas e encontros.

 

Vou buscar viver como Sêneca relata abaixo, agradecendo que tenho ...

    

“ O homem é tão mesquinho que, mesmo tendo recebido muito, considera-se injuriado se pudesse ter recebido mais... (...) Sobretudo, agradece aquilo que recebeste; aguarde pelo restante e alegra-te por não estares ainda satisfeito: é um prazer haver algo por que esperar...”

                                                                     Seneca in “Da Ira.”

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário